Justiça encontra R$ 3 bi esquecidos em contas de empresas e trabalhadores e procura donos de dinheiro

“É um valor importante. Tudo isso em contas judiciais de empresas e trabalhadores, mas de trabalhadores em número menor, que foi esquecido nas contas mesmo”, afirma.

Em fevereiro de 2020, R$ 2 bilhões haviam sido rastreados. O levantamento foi feito pelas corregedorias locais dos 24 TRTs (Tribunais Regionais do Trabalho). (Foto: Reprodução)

 A Justiça do Trabalho localizou R$ 3 bilhões esquecidos no Banco do Brasil e na Caixa Econômica Federal. O dinheiro depositado pertence a empresas e trabalhadores. Agora, procuram-se os donos.

O balanço consta do Projeto Garimpo, da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho. A iniciativa foi implementada em fevereiro de 2019 para regulamentar o tratamento dado a depósitos abandonados em processos.

Em fevereiro de 2020, R$ 2 bilhões haviam sido rastreados. O levantamento foi feito pelas corregedorias locais dos 24 TRTs (Tribunais Regionais do Trabalho).

Do montante, apenas R$ 183 milhões foram liberados para saques após a identificação dos titulares das contas. Um ano depois, foram localizados mais R$ 1 bilhão e, desse total, R$ 268 milhões estão disponíveis a quem de direito.

O dinheiro está parado em contas de depósitos recursais. Para questionar uma decisão na Justiça do Trabalho, a empresa precisa deixar uma garantia em contas judiciais.

A quantia localizada trata-se, em sua ampla maioria, de resíduos em contas em razão de correções monetárias após a fase de execução, quando se chega ao cumprimento da sentença. Finalizados, os processos já se encontram em arquivo.

Segundo o corregedor-geral da Justiça do Trabalho, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, mais dinheiro pode estar esquecido nas contas. Ele diz não ter o número de pessoas jurídicas e físicas beneficiadas pela iniciativa.

O ministro destaca a relevância de se encontrar os donos dos recursos em meio à pandemia da Covid-19. “Em um momento de crise, é caixa que estaria abandonado. Isso pode ter uma repercussão econômica de destaque nesse momento de crise absurda. Muitas vezes são valores significativos para as empresas”, diz.

“É um valor importante. Tudo isso em contas judiciais de empresas e trabalhadores, mas de trabalhadores em número menor, que foi esquecido nas contas mesmo”, afirma.

O projeto integra uma série de ações do ramo trabalhista que visa intensificar o uso de novas tecnologias. A intenção é acelerar a implementação do que gestores chamam de Justiça 4.0 no contexto dos 80 anos da Justiça do Trabalho, a serem comemorados no sábado (1º), Dia do Trabalho.

Nesta segunda-feira (26),o jornal Folha de S.Paulo mostrou que magistrados e servidores têm recebido treinamento para usar as chamadas provas digitais e reduzir a dependência de depoimentos de testemunhas e partes.

É estimulado o uso de redes sociais, rastreamento por celular, mensagens em aplicativos e biometria para produção de provas. Dados poderão ser capturados com operadoras de telefonia, aplicativos, serviços de backup e nuvens de armazenamento.
No caso das contas judiciais, o dinheiro pode ser sacado em até dez anos. Passado o período, o recurso é revertido para os cofres da União.

Se a empresa foi à falência, o montante é destinado ao juízo falimentar — o juiz natural do processo. Se a empresa ainda funciona mas tem outras dívidas pendentes em ações trabalhistas em outras varas, o dinheiro é destinado para cobri-las.

Neste ano, em razão da pandemia, valores considerados ínfimos e abandonados em contas — no total de até R$ 150 — passaram a ser destinados à União para o combate à Covid-19. Até o momento, foram revertidos R$ 12 milhões.

“Fizemos regulamentações em convênio com a Secretaria da Receita Federal e criamos um código de DARF [(documento de arrecadação de receitas federais)] para que os valores pudessem se destinar para Covid ou questões sociais que a União entender necessárias”, diz Veiga.

Presidente da Anamatra (associação de juízes do trabalho), Noemia Porto afirma que o projeto é uma central de informações, “de inteligência”.

“Só se tornou possível porque a Justiça chegou ao patamar de 100% eletrônica, consegue fazer rastreamento, corrigir procedimentos, encontrar o valor e ir atrás da pessoa para que venha a receber. É emocionante”, diz.

Segundo a juíza, empresas, trabalhadores e sindicatos esquecem o dinheiro. Ela conta um caso concreto de busca por herdeiros para ilustrar o impacto da localização dos donos dos valores.

“Tem histórias tristes. O processo por várias razões demorou muito tempo, o trabalhador migrou para outro Estado em busca de melhores condições de vida e de trabalho e lá pelas tantas o processo finalizou e tem R$ 30 mil líquidos.”

Segundo Porto, chegou-se nesse caso à mãe do trabalhador, que “era sozinho na vida e morreu”. “Aí, R$ 30 mil para aquela família pobre no Maranhão fez muita diferença”, diz.

“É aquele momento em que se pratica um ato como juíza ou como juiz que não vai para estatística nenhuma, não se produz nem mais nem menos, não vai ser considerado o juiz mais produtivo, mas, naquele momento [quando se encontra o dono do dinheiro], você se sente juiz mesmo, faz a diferença.”

As informações sobre eventual direito ao recebimento de valores abandonados nas contas, por enquanto, devem ser solicitadas na vara em que o processo foi ajuizado. A Corregedoria-Geral ainda está desenvolvendo um sistema centralizado de dados, sem data de lançamento.
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A CHAMADA JUSTIÇA 4.0 NO RAMO TRABALHISTA

PROVAS DIGITAIS
– Programa de 2020 prepara juízes para adotar as chamadas provas digitais e, assim, diminuir a dependência de depoimentos de testemunhas e partes
– 86 juízes participaram da primeira turma em novembro de 2020 e mais 50 se formaram nesta segunda-feira (26) para replicar as técnicas nos 24 tribunais regionais
– A medida visa coletar dados para produção de provas em redes sociais, rastreamento por celular, mensagens em aplicativos e biometria

JUÍZO 100% DIGITAL
– Sistema permite os atos processuais -audiências e sessões de julgamento- por meio eletrônico
– Foi aprovado por resolução do CNJ (Conselho Nacional da Justiça) em outubro de 2020
– Dispensa comparecimento físico das partes em fóruns

BALCÃO VIRTUAL
– Criado em 2021, o Balcão Digital permite por meio de videoconferência o acesso ao setor de atendimento das varas, chamado popularmente de balcão
– Funciona no mesmo horário de atendimento presencial ao público
– Atende advogados e partes dos processos

SISTEMA BEM-TE-VI
– Inteligência artificial faz análise desde 2018 da chamada tempestividade dos processos
– Verifica-se automaticamente se recursos respeitam os prazos para tramitação no TST (Tribunal Superior do Trabalho)
– Em um ano, 10 mil processos foram considerados intempestivos (fora do prazo)

GEMINI
– Módulo do PJe (Processo Judicial Eletrônico), usa inteligência artificial para agrupar documentos de processos por similaridade de temas
– Reduz uso de recursos humanos
– Permite aos órgãos julgadores identificar processos com documentos similares e fazer análises conjunta

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